Há semanas venho refletindo sobre as dificuldades que algumas de nós mulheres negras enfrentamos dentro da academia. Depois de ler um texto lindíssimo da Stephanie Ribeiro sobre preconceito linguístico e como este afeta principalmente a vida das mulheres negras, resolvi que era o momento de escrever sobre isso.
A sensação de ler um texto e se identificar nos proporciona uma sensação de conforto, normalmente nos sentimos menos “de outro planeta” por descobrir que algumas dificuldades que enfrentamos na faculdade não aconteça apenas com a gente. Pensando nisso, decidi que este texto seria um pouco diferente do que estou acostumada a escrever, menos palavras bonitas, menos termos científicos. Quero escrever um texto que o mais importante seja a minha experiência, minha percepção sobre o que é ser mulher negra e estar na academia e menos com embasamento teórico ou cientifico.
Exercendo a própria perspectiva do feminismo negro interseccional, do qual as experiências dos sujeitos devem ser consideradas na produção do discurso, estou partindo da idéia de que as nossas vivências possivelmente nos proporciona uma visão mais crítica sobre determinados problemas sociais, que não são só sociais, são nossos.
Desde da última vez que li um texto da bell hooks chamado Intelectuais Negras, passei a enxergar a minha vivência na academia de uma outra forma, de modo, a perceber as minhas dificuldades relacionadas a este espaço em muitos os sentidos.
Quando iniciei o curso, pensei que já havia rompido com a maior barreira – Entrar na universidade. Da turma da escola por exemplo, fui uma das poucas, mulher e negra, provavelmente fui a única naquele ano. Lembro, que aquele ano foi muito difícil, por estar em um curso de humanas, logo no primeiro semestre fui bombardeada com textos, autores , teses, e toda a história da construção do pensamento cientifico ocidental. E com tudo isso, ainda tinha aquele grande detalhe, a faculdade era privada, então, bóra trabalhar pra pagar a mensalidade.Realidade de muitas de nós que por todo histórico de ensino de algumas escolas públicas, passar na FUVEST se tornou apenas um sonho.
Lendo textos no caminho do trabalho, fazendo atividades, seminários, trabalhando oito horas por dia, não faltando nas aulas, estudando para as provas, dormindo 3 horas. Por muito tempo está foi a minha rotina. Talvez nada disso, seja novo pra você está lendo este texto, a maioria de nos estudantes de universidade paga, vivem os quatro anos dá graduação exatamente assim. Mas, á questão é, quem fala sobre as dificuldades? Sobre os dias que saiu da aula se sentindo um burro por não ter entendido uma palavra do que o professor(a) disse? Por ter ido mal na prova? Quem fala das inúmeras vezes que pensamos em desistir?
Acredito que não falamos por muitos motivos, por vezes estamos tão preocupadas com as expectativas das outras pessoas, em manter o pesado fardo de ‘mulher negra forte’ que acabamos nos esquecendo de olhar pra dentro de nós , encarar os nossos medos, nossas inseguranças, entender que elas existem sim e não tem nada de errado em assumir isso, pois eu acredito que o primeiro passo pra solucionarmos um problema é reconhecer que ele existe.
Reconhecer que a vida já é dura demais com a gente, não precisamos ser também. Permita-se reconhecer suas fraquezas, seus medos, que não cabe a mim dizer aqui quais são, pois sei que possivelmente temos algo em comum, somos mulher e negra, porém é preciso reconhecer que as intersecções existem, minha intenção não é falar por todas as mulheres negras, precisamos romper com esse discurso universal. Precisamos dar voz a diferentes formas e vivências do que é ser mulher negra, respeitando as subjetividades.
Compartilho este texto, com intuito de que as minhas experiências pessoais possibilitem outras pessoas se identificarem e diante disso, conjuntamente possamos lutar contra aquilo que nos aprisiona, ultrapassar a linha invisível que nos foi imposta pela sociedade e assim fazermos das nossas dificuldades nossa força para lutar.
Imagem – Instituto bell hooks
Referências
Texto: Preconceito linguístico como isso afeta o empoderamento feminino – Stephanie Ribeiro – http://www.lado-m.com/preconceito-linguistico-como-isso-afeta-o-empoderamento-feminino/
Texto: Interectuais Negras – bell hooks
https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref/article/view/16465/15035