Durante muito tempo, eu só andei com pessoas brancas na escola, eu as escolhia, evitava ao máximo andar com pessoas negras, afinal, ser negro era ruim, era ser feio e eu não queria ser comparada a eles. Até porque eu não era negra, eu era moreninha.
Há pouco tempo atrás, vi afirmações de feministas negras a respeito das diversas solidões que a mulher negra enfrenta, que não se limitam só ao campo afetivo-sexual, a coisa é muito maior que isso. Como eu nunca tinha me atentato a este fato, comecei a me sensibilizar às outras faces que a solidão tem na vida da mulher negra e a primeira coisa que lembrei foi dos meus grupos de amiguinhos na escola. Nos quais, na maioria das vezes, eu era a única preta.
Apesar da vontade de ter amizade com pessoas negras, eu as mantinha longe por vergonha delas, por vergonha de mim. Os coleguinhas brancos, eram companhias não muito agradáveis. Lembro que na pré escola eu apanhava, mas aguentava aquilo, no ensino fundamental, sofria bullyng, mas também aguentava, no fundamental II, era humilhada por algumas amigas brancas, mas aguentava também. As coisas só melhoraram quando entrei no ensino médio.
Era ruim estar com aquelas pessoas, que de alguma forma se sentiam melhores que eu, pelo fato de serem brancas. Ainda hoje, continua ruim ser a única pessoa negra no cinema, a única pessoa negra no trabalho, a única pessoa negra no grupo da faculdade, a única pessoa negra no rolê, a única pessoa negra que não está servindo.
Em 2012, eu entrei na universidade e depois comecei a trabalhar e, consequentemente, as pessoas ao meu redor começaram a ter outro perfil demográfico e racial. E aí, comecei a prestar atenção na solidão socioeconômica, que me limitou a ter acesso e a experimentar coisas que para eles era muito simples ter, mas pra mim, era e é um luxo.
Claro que não quero excluir as pessoas brancas da minha vida, mas sim, incluir mais pessoas negras em lugares que lhe foram negados por causa de estruturas racistas.
Mesmo só, sinto que minha existência e permanência nesses lugares é, de alguma forma, uma resistência, eu, mulher, negra, periférica e pobre, ocupando um lugar onde eu sou “única”.
É ruim viver com a certeza que a solidão sempre estará ao meu lado por causa da cor da minha pele. Às vezes, o que eu mais quero é uma mulher negra ao meu lado, pra chorar no colo dela, pra trocar um olhar de reprovação quando alguém fala alguma merda racista, a única coisa que eu queria era estar com alguém que vive as mesmas dores que eu.
Mas para amenizar o peso dessa solidão, a forma que encontrei foi aprendendo a me amar, a me ver como um ser importante, capaz de ajudar outras mulheres negras que também estão sozinhas. Como bell hooks diz em “Vivendo de Amor”, o amor é capaz de curar.
“Quando nós, mulheres negras, experimentamos a força transformadora do amor em nossas vidas, assumimos atitudes capazes de alterar completamente as estruturas sociais existentes. Assim poderemos acumular forças para enfrentar o genocídio que mata diariamente tantos homens, mulheres e crianças negras. Quando conhecemos o amor, quando amamos, é possível enxergar o passado com outros olhos; é possível transformar o presente e sonhar o futuro. Esse é o poder do amor. O amor cura.” bell hooks – Vivendo de Amor
Espero que você, preta, encontre no seu reflexo no espelho, uma linda declaração de amor, de você, para você mesma.