Meninos negros: nunca suspeitos, sempre culpados
Em memória de:
Roberto Silva de Souza, 16 anos
Carlos Eduardo da Silva de Souza, 16 anos,
Cleiton Correa de Souza, 18 anos,
Wilton Esteves Domingos Junior, 20 anos
Wesley Castro Rodrigues, 25 anos
Pablo Nascimento, 17 anos
Mike Brown, 18 anos
Arão de Paula Santos, 23 anos
Luan Lucas Vieira de Oliveira, 20 anos
Elenilson Santana da Conceição, 22 anos
“Caminhando pelas ruas
Eu posso ver claramente
Oh Senhor
Outro corpo cai
Alguém foi atingido
Oh Senhor
Me diga, Você pode me ouvir?
Eu preciso saber, Você pode me ouvir?
Oh Senhor”
A CPI que objetivou apurar as denúncias sobre o genocídio da juventude negra no Brasil, concluiu que “essa parcela da população negra vem sendo vítima de um genocídio simbólico”. Mas não são símbolos que sangram. Não são corpos simbólicos caídos no chão. Não são hologramas as vidas retiradas em Salvador, em Belém, no Rio de Janeiro nem em Chicago. São corpos negros jovens que sangram e são expostos depois em lágrimas doloridas nos cemitérios. São peitos de mães negras que sangram e gritam em nome de algum deus que isso faça sentido. Não faz. Nunca fará!
Alguns dados deste “genocídio simbólico”:
Segundo dados do PNDU 33 mil pessoas negras foram mortas em 2010.
O Mapa da Violência publicado em 2015 afirma que o homicídio de jovens negros saltou de 17.499 para 23.160 entre 2002 e 2012.
Na última semana, 111 tiros disparados contra 5 jovens negros na Zona norte do Rio de Janeiro.
111 tiros
São número que amendrontam, todos os dias, milhares de mulheres negras que temem entrar para essas estatísticas nacionais: de mães que tiveram seus filhos negros executados pelas forças repressoras do poder público, as polícias (militar, municipal, federal e civil) e pelas forças armadas. As ocorrências que são divulgadas pela grande mídia, nem passam perto das centenas de execuções diárias. As famílias negras que vemos chorando nas tvs e nos jornais, a cada vez que algum episódio é divulgado, representam as milhares de mães que passam dias e noites tensas enquanto seus filhos não estão em casa.
Os cinco jovens negros executados sábado passado (28/11) em Costa Barros, no Rio de Janeiro, são exatamente o resumo desse dolorido cenário e corriqueiro. Os cinco jovens estavam em comemoração, dentro de um carro, a caminho de um lanche. Era o primeiro salário de um deles, o primeiro emprego como Jovem Aprendiz. E os sábios de plantão insistem em dizer que basta querer mudar de vida, que as oportunidades estão aí para todos.
TODOS QUEM?
As fotos divulgadas da execução dos meninos dilacera e desestrutura a cabeça e o coração de qualquer mãe que tenha filho negro, por sabe que seu filho poderia estar ali dentro. Elas podem ser somadas aos álbuns de fotos das saudades que estas mulheres jamais deixarão de sentir, pois estes jovens jamais chegarão de novo.
“A dor de mandar pra escola, de saber que pode ser o próximo, que ele não vai crescer, e se crescer o sentimento de medo jamais passará”
(Maria Rita Casagrande, mãe de Pedrinho, de 9 anos)
A essa dor, unem-se a dona Tereza no Rio, dona Suzana em Belém, dona Glória em Manaus, dona Zilda em Barueri (SP) ou dona Marina em Salvador, são algumas destas mães de filhos negros que sequer tiveram a chance de se despedir dos moleques. Todos executados pela Polícia Militar e em situações diversas.
Diuturnamente, centenas de jovens negros, especialmente os meninos, são alvejados pelas polícias sem qualquer motivo que justifique tantas execuções, afinal, não estamos em guerra, certo?
SERÁ?
O cenário de execuções de jovens negros no Brasil é maior do que em muitos países que vivem oficialmente em guerras. Mas há quem diga que o movimento negro inventa ou aumenta essas informações, porém, feliz ou infelizmente, já existem instituições publicando dados qualificados e mostrando algo que vem sendo dito desde a abolição da escravidão negra no Brasil: os jovens negros não tem o luxo de planejar a vida, pois se depender do poder público, não haverá vida para o jovem negro brasileiro.
Existe uma pesquisa desenvolvida na Universidade Federal de São Carlos, com a Polícia Militar de SP, que evidencia bastante o racismo da instituição, pois os policiais consideram como suspeito o homem negro, de qualquer idade. A descrição física do criminoso suspeito tem a pele preta e isso é tão real que em 2013 a PMSP distribuiu um folheto com dicas de segurança pública no qual o criminoso era ilustrado como um homem negro.
Há quem diga que no Brasil não existe pena de morte. Mas o que se vê contra a juventude negra são penas de morte muito bem estruturadas. É jovem, é preto, é bala. E a PM tem autorização e legitimidade para a prática destas penas de morte por meio dos Autos de Resistência, que dá impunidade aos policiais homicidas. E a execução dos 5 garotos no Rio de Janeiro a PMRJ tentou forjar um auto de resistência, fraudando a cena do crime para implantar uma falsa prova. Por sorte, destas vez as testemunhas não calaram, não foram vencidas pelas repressões.
O Brasil está na onda mundial para a militarização das polícias. A cultura do “atirar para matar” tem ganhado força e sido cada vez mais mais ampliada pelo poder público. É novamente o país se colocando em situação de guerra, sem estar em guerra oficialmente, pois a cultura do “shoot to kill” foi criada para o combate a homens-bomba em Tel Aviv.
As milícias estão autorizadas a matar onde a PM tem dificuldade de aparecer à luz do dia. E os noticiários cobrem as mortes como “guerra entre traficantes”, “vítimas do tráfico”, onde todas as provas são forjadas ou retiradas do local do extermínio, corpos são mutilados ou escondidos e as vítimas (negras e jovens) tem qualquer relação com o crime organizado.
Não é simbólico, prezados deputados. E real. E dói em cada peito preto desse país. A nossa denúncia vai continuar. E se o Estado brasileiro se recusar a reparar tudo o que temos perdido, nós cobraremos cada vez mais, não nos peçam retidão, porque o que nós temos é muita raiva. Mesmo sabendo que esses meninos não voltarão e mesmo entendendo que essa dor nunca passará.
Os Governos, a Polícia Militar, as Secretarias de Segurança PRECISAM ser acionadas junto aos órgãos internacionais e cobradas por esse extermínio. Continuaremos a lutar por vocês, meninas e meninos negros. Por todos vocês que tiveram suas vidas ceifadas, nos perguntando sempre quais eram seus sonhos, seus anseios e futuro. Não nos calaremos, não desistiremos nem por um segundo. Resistiremos.
A exemplo de que nunca deixaremos de cobrar, são alguns atos que acontecerão amanhã no Rio de Janeiro e em São Paulo e para os quais CONVOCAMOS o povo preto, essa dor é nossa, essa luta é nossa, a rua é nossa e temos o direito de exigir que este genocídio acabe.
Atos no Rio: https://www.facebook.com/events/981869471886665/
https://www.facebook.com/events/1650872845200750/permalink/1651071365180898/
Ato em SP: https://www.facebook.com/events/1740379542856527/
Ato em Brasília: https://www.facebook.com/events/1508890976071210/