Por Elis Almeida para as Blogueiras Negras
No último dia 25 de setembro foi aprovado pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS) o Projeto de Lei que obriga as unidades do Sistema Único de Saúde a oferecerem condições humanizadas de parto.
Parto Humanizado – o termo por si só trás várias interpretações -, segundo a redatora senadora Ana Rita (PT – ES):
Caberá as normas infralegais editadas pelos gestores do SUS as principais diretrizes, bem como as normas técnicas que deverão orientar a assistência ao parto de forma que sejam atendidas as condições que garantem um parto de qualidade e com características humanizadas.
Esse tema pode, a princípio, não despertar interesse de muitas pessoas, mas há muito no que pensar, especialmente quando se trata de direitos sexuais e reprodutivos no sistema de saúde, que atende basicamente pardas e negras de baixa renda e com pouca ou nenhuma escolaridade. Mulheres com melhor grau sócio-econômico estão na sua maioria sendo atendidas no setor privado ou saúde suplementar.
É preciso ter em mente que só se nasce uma vez, e o mais lógico e justo é que o momento do parto e/ou nascimento seja cercado de cuidados e respeito. Para a mulher que gesta, informação sobre as opções fará diferença na escolha e tomada de decisão. Nem todas as mulheres, ainda que tenham informação, poderão contar com assistência da equipe que escolheu, muitas não terão acesso ao local de parto de sua escolha, e não tendo acesso a informação, não saberão que é um direito escolher o local e o tipo de parto. A série de reportagens “Dores do Parto”, e o projeto “1:4 Retratos da Violência Obstétrica”, mostram claramente de que forma as mulheres têm sido violentadas em seus partos.
Com esses dados, quero mostrar que a violência é real, ela existe, principalmente quando se trata de sistema de saúde pública. Sistema esse que atende, na grande maioria, mulheres negras e pobres, adolescentes que não tiveram acesso a educação sexual e planejamento familiar, com pouca ou nenhuma informação. Estas, sim, têm seus direitos desrespeitados, são facilmente coagidas e reféns da instituição, não reconhecem a violência, aceitando-a por acreditar que é assim que deve ser, e não sabem que podem e devem reclamar seus direitos.
Temos ouvido falar de Parto Humanizado no SUS já há algum tempo, na Lei do Acompanhante, na Rede Cegonha, mas na prática nenhuma dessas ações funciona efetivamente, e quando funcionam, a pessoa atendida acredita que lhe foi feito um favor, pois não conhece seus direitos legais como cidadão e contribuinte.
Parto Humanizado, ao contrário do que muita gente pensa, não é ter música ambiente e/ou pouca luz no momento do parto, mas um conjunto de ações que visa um parto satisfatório, no qual a mulher e o bebê são os protagonistas, onde a atenção e os cuidados estão totalmente voltados para o binômio (mãe e filho), e não centrados no médico e instituição. Então, para humanizar parto e nascimento, não carece somente instituição e obstetra/obstetriz, ou enfermeira obstétrica ( conhecidas como Parteiras Urbanas) mas passa também pelo direito de escolha do local de parto segundo a OMS.
O modelo de formação dos profissionais de saúde materno-infantil é tecnocrata e medicalocentrista, ou seja, centrado na figura do médico e em técnicas, a despeito do desejo da parturiente. Felizmente, os poucos humanistas, em meio a grande quantidade de profissionais engessados produzidos pelo sistema e para o sistema, têm feito um excelente trabalho, haja visto que há hospitais como o Sofia Feldman e o ISEA com equipe multidiciplinar coordenada pela Drª Melania Amorim.
Somente com conhecimento é que podemos vencer o sistema e fazer valer nossos direitos. E de mais a mais, não há acréscimo nenhum com essa aprovação feita pelo Senado. Uma lei que já existe, pouco se fala a respeito, e não há previsão de sanção, ou seja, não há o que comemorar.
Ter um Projeto de Lei que prevê parto humanizado pelo SUS é, sem dúvida, uma conquista, mas precisamos cobrar para que a lei se faça cumprir, coisa que na prática não acontece com as propostas existentes.
Para saber mais sobre parto humanizado, violência obstétrica, como e onde denunciar, visite o site Parto do Princípio.