Por Márcia Vasconcelos para as Blogueiras Negras
O sofrimento negro. Não é engraçado, nem quando todo mundo esta rindo.
Desde criança eu tentei ser aceita. Alisei meu cabelo, Nunca usei roupas que “não” combinavam com meu tom de pele e é claro o batom vermelho passei longe, tentei ser: “ negra de alma branca”, porque só assim poderia redimir o peso que minha cor trazia socialmente.
Mas mesmo assim eu sempre convivi com piadas, comentários racistas que eram mascarados com o chamado humor.
Qual de nós nunca viu ou presenciou um negro sendo comparado a um macaco, ou a famosa frase tão preto que no escuro só aparecem os dentes, sem esquecer o hino racista: nega do sobaco cabeludo (a questão aqui não é o pêlo).
Todas essas afirmações, piadinhas e até músicas tem a mesma desculpa, é engraçado, foi só uma piada.
Não é. Mesmo se todos riem, mesmo vindo de uma criança, mesmo de qualquer forma. Dói porque deprecia as características negras, e justificar com humor é uma das formas mais covardes de racismo, pois se você contesta passam para você o cálice de racista ou de negro radical. Eu ouvi várias dessas coisas, fiquei sem reação, ri mesmo não tendo achado graça nenhuma, já fui pra casa chorar depois de ter rido.
Quando seu cabelo é comparado a uma palha de aço, quando dizem que “preto rouba” ,quando sempre o comentário remete a sua cor ou a uma característica física, e isso acontece desde que você se vê enquanto pessoa no grupo social, você acaba achando isso normal, corriqueiro, nos acomodamos com o racismo humorístico.
Mas isso não é engraçado, nem se for feito pelo maior comediante do mundo, essas piadas sempre tentam colocar o negro em uma situação em que ele odeie suas características como eu odiava meu cabelo, e pensava que minha pele não aceitaria qualquer maquiagem que eu quisesse, ainda tenho certa dificuldade em usar alguns tipos de tons (estou trabalhando isso) e achava meu nariz uma aberração. Uma das ditaduras sempre exploradas por pessoas racistas é a ideia que somos feios, o negro é feio e tudo que se remete as nossas características é algo ruim.
E temos que nos atentar quanto a isso, até mesmo a frase humor negro não me é visto com bons olhos já que o termo negro é posto como negativo mais uma vez.
As pessoas têm me achado radical, ultimamente tenho me comportado diferente… Fora dos padrões. Tenho me comportado como uma negra, não aliso meu cabelo, comecei a usar mais cores nas minhas roupas, e sim passei batom vermelho, mesmo correndo o risco me internarem já que fui ousada e entrei no mundo de privilégios brancos, quanto as piadinhas … Elas não acabaram, ainda mais que sou: Preta e sapatão, a diferença esta na minha personalidade eu não finjo um humor, não perco meu tempo nem ouvindo, e evidenciei uma falta de graça que sempre existiu, eu não preciso ser aceita, eu me respeito, amo meu cabelo crespo, ah! Quase me esqueço, troquei o vocabulário de ruim, passei a referir ao meu cabelo como crespo tenho orgulho dele e do que ele representa pra mim: LIBERDADE.
Meu nariz então? Nossa, parei de juntar o dinheiro para cirurgia, já que a piada do nariz de assar pão é tão pequena como as piadas racistas, eu me libertei dos rótulos raciais e saí do grupo de negros que “riem” de piadas de negros, sou a dita rebelde, que não aceita piada, a do contra, e não ligo, só quero que consigamos passar para todos desde crianças até adultos que cada pedacinho do nosso corpo conta uma história, que somos lindos e piada relacionada à etnia é racismo, espero que as crianças negras não tentem ser aceitas como eu tentei, não chorem escondido no quarto, e não riam!
Vamos guardar nossos belos sorridos para algo útil, como a aceitação de si, por exemplo, que tira sorridos maravilhosos, dos nossos lindos lábios.
7 comments
Gente ! Esse texto me descreve
”Vamos guardar nossos belos sorridos para algo útil, como a aceitação de si, por exemplo, que tira sorridos maravilhosos, dos nossos lindos lábios.” O meu sorriso tu já tirou, muito obrigada por ter me mandado esse texto, ele veio na hora certa. <3
Que tenha gargalhadas diárias ao se olha no espelho e se embriagar com sua beleza ,vc é negra e com isso sua formosura ja é algo esperado. Conta comigo enegrecer é um processo constante e nem sempre fácil ,vamo que vamo.
Isso mesmo preta, sabe o que me deixa mais chateada no seriado? TODOS sabem que o Cris sofre preconceito direto e ninguém faz nada, eu pretendo escrever sobre a professora do seriado que pra mim é a pior, como uma educadora subjuga um aluno por sua cor? é nojento pensar .. mas eu me recordo ao passado .. a maioria das minhas professoras tinha dó ( racismo piedoso) de mim simplesmente pelo meu tom de pele e como eu sempre fui boa aluna ( pra uma neguinha pobre sem pai) algumas diziam que eu iria longe mesmo a minha vida sendo mais difícil .. Como assim gente??? eu acredito que temos mais ” senhoritas Morelos” como a do Seriado e queria muito ensinar as crianças e adolescente a se defenderem delas, são mais nocivas que os alunos já que delas vem a autoridade dentro da sala.
E vamos Continuar mudando nosso vocabulário
ps: Moreninha também me mata de ódio.
Outro Forte !!!
Pois é Rosangela aprendi mais sobre piadas de negros na escolar do matéria acadêmica, eu imagino que deva ter bem mais coisas para contar que eu, e com isso tenha sofrido bem mais … hoje eu sei me defender ,me preocupo com as crianças que são tão indefesas quanto eu fui, sofreram tanto quanto eu, não sei se as pessoas fazem ideia da marca intelectual que o racismo deixa… e dói sabemos que dói. Mas a luta não para e devemos avançar mais !!! nos ajudamos a construir mais da metade desse país, ainda que de uma forma bruta, e eu não me permito mais sofrer com o preconceito de pessoas ignorantes
Somos negras somos fortes
Nas frases que mencionam que o “sofrimento negro” não é engraçado, nem quando nós mesmos “rimos”, lembrei daquele seriado Todo Mundo Odeia o Cris. Tem muitas partes nas quais realmente não consigo rir, como o que ele passa na escola (e aquela professora cretina!) e quando ele faz comentários generalistas sobre as pessoas no bairro dele. Creio que ainda foi a forma de o autor trazer à atenção certas coisas, só é uma pena que nem todo mundo assista com o devido senso crítico, pois muita coisa ali realmente não tem graça. Morro de raiva do que o seriado diz sobre as mulheres: que são mandonas, de lua, folgadas, que as negras são briguentas e tal. Mesmo sendo trágico demais resolver mostrar as que apanham dos maridos; daria pra nos poupar desse estereótipo ordinário.
E, como você, já retirei do meu vocabulário “expressões discriminadoras”, como “passado negro”, “humor negro”, “ovelha …
Abraços!
Muito boa toda essa reflexão, sendo uma jovem senhora de 56anos já passei e escutei uma coleção de ditos, “claro” nunca racista “sou eu que vejo racismo em tudo, mas o pior do que o negro de alma branca é o quando num caga na entrada caga na saída…e vamos relatar varios, branco correndo é atleta, preto correndo é ladrão, branco de branco é medico preto de branco é macumbeiro, e aí esse racismo institucionalizada vai encontrar tb nossa fé, a pomba da paz é branca a galinha do despacho é preta…gato preto é azarmas como vivemos num país sem racismo… e como lesbica tb temos mais acúmulos de culpas de feiuras, qtas de nós em princípio de relacionamento levantou mais cedo para prender os cabelos que estavam assanhados, afinal nosso cabelo é bandido tem que andar preso ou amarrado…E salve Novembro