ando sem saber ao certo como começar isso aqui.
falo com casualidade sobre isso porque por muitos anos aqui foi o meu lar.
essa tela do computador, com um aplicativo em formato de folha de papel e teclas.
antes as coisas não eram tão casuais assim, eram bem mais íntimas. continha minha letra e, às vezes, marcas de lágrimas.
não lembro quando, ao certo, minha voz foi silenciada. meus sentimentos foram calados. não me lembro também quando comecei a compartilhar meus sentimentos através da escrita. não sei há quantos anos utilizo dessa “válvula de escape”, mas agradeço o quanto ela impediu de me jogar do abismo. me perdi desse hábito no momento em que colidi com o (im)perfeito e lindo desastre que eu sou. ou melhor, com o que estou aprendendo a ser. papo de se enxergar pelo panorama completo. ficar de frente com os demônios que há anos eu reconheço, demônios que nunca percebi que me acompanhavam, insegurança exacerbada, vulnerabilidade latente, amor transbordante. diversos advérbios de intensidade para tentar mostrar o quanto esses sentimentos são significantes. uso de escolhas complexas para tentar passar quão abstratos esses sentimentos são, pelo menos para uma negra mulher que desaprendeu sentir, tentar entender.
sempre me senti forte e firme por ter uma razão e um coração doce, em vista de tudo que já passei. exalei certezas e uma saúde mental sã por vezes demais, a ponto de acreditar nessa verdade absoluta e ficar longe da realidade. a realidade é mais dura, e tornar os pensamentos reais era doloroso demais, guardar eles foi uma escolha tida como segura. até que o seguro se perdeu no sentir. onde antes havia milhões de emoções compartilhadas em um texto e caladas no meu ser, deu lugar para o adormecimento da minha personalidade. me perdi do personagem que criei e de tudo que já fui.
e agora quem eu era?
achei por muito tempo que eu era o resultado das minhas dores. que a pessoa que aqui se firmava só poderia compartilhar sujeira. porque o meu corpo foi tratado assim por mais vezes do que eu gostaria de lembrar. foi olhado o suficiente para eu querer me esconder. foi calado de sentir a ponto de realmente ter sobrado apenas o silêncio na minha alma. difícil foi perceber que todo caminho tem duas escolhas. acho que esse é um provérbio meio antiquado e talvez eu tenha errado ao escrever ele, minha memória não anda lá muito boa. enfim, esse clichê é tão verdadeiro quanto o “dê tempo ao tempo”. lembrar do quanto já ouvi esses dois e quis fingir que meu método de controlar o tempo e minhas escolhas dava certo me faz ter raiva por ver que foi assim que perdi tempo.
o que seria então essa palavra? não consigo responder porque também estou à procura da resposta. ou em busca de qualquer coisa racional para não assumir como a vida abstrata tem me aberto os olhos e me feito sentir a brisa do equilíbrio. minha breve conclusão depois de muitos dias pensando sobre isso é de que a gente briga muito pra ser perfeito e esquece de ser feliz. se adapta tanto ao caos que esquece como ter paz é importante, a ponto de que você não precise se lembrar de respirar. porque tem dias que a ansiedade tapa meus olhos, prende minha respiração e meus pensamentos correm mais rápido do que a imobilidade que meu corpo se encontra. não que eu não goste do caos, se tem algo que aprendi é que a razão de tudo é a busca pelo equilíbrio. então procuro agregar esse caos que me transborda à calmaria que me invade. a abraçar a cachoeira que em mim habita, nos dias de sol e nos dias de tromba d’água. esse texto está longe de falar sobre caos, porque essa palavra sempre foi associada à parte das pessoas que elas preferem esconder. a parte que em mim eu sempre escondi foi a parte associada à paz.
ser caótica me fez aprender a gingar no eterno jogo que é a vida. me fez ser gato que olha com o olhar desconfiado para tudo e todos. manteve meus pés no chão e a mente racional. emoção para mim sempre foi tida como desequilíbrio e a imagem que eu precisava mostrar para qualquer pessoa que me cercava era a de certeza. de fortaleza inabalável para cuidar não só da minha vida, como a de quem estava do meu lado. minha bela colisão se deu no momento em que calei todas as vozes e ouvi, no silêncio de se olhar no espelho, meu pedido de socorro. escolher ouvir essa parte tão frágil e sentimental dentro de mim me fez ficar de frente para a cura, com o perdão e com o sentimento de culpa que dominava minha alma.
tudo isso para alcançar o tão almejado equilíbrio. pessoas positivas chamariam isso de transcender o ser. mas eu nunca fui positiva e ainda prefiro a razão, então chamarei isso de compreender o meu ser. equilíbrio é uma das palavras que mais têm me atormentado a mente. chegar em um ponto em que eu esteja 100% curada das minhas dores até o osso e que não terei um dia de melancolia, de ficar imobilizada seja pela ansiedade ou pelo baque da vida em si. pensei que seria entrar nesse estado mental de “controle” emocional que seria o equilíbrio.
mas a verdade é que esse pensamento me fez ter medo do futuro. o que eu seria sem a parte que ama os dias nublados e frios para ouvir as músicas mais tristes do grunge, os dias em que eu choro até dormir, a razão do que eu tomava como essência dos meus textos, minha solidão, minha falta de voz… optei por ressignificar esses sentimentos, buscar fazer real a minha voz diante de um silêncio que não me é mais acolhedor. e assim vou de encontro ao acalanto no que tomei para mim como equilíbrio, à compreensão de um mantra que há um bom tempo eu verbalizo mas que só entendi seu valor hoje. tá tudo bem, nada está sob o controle. antes eu sabia gingar com o caos. hoje eu aprendi a entrar no ritmo que a poesia da calma me conduziu. viver um dia por vez nunca foi tão singular, perceber que todo sentimento é válido e talvez eu não me encaixe em nada porque ser ampla demais é meu passaporte para a libertação. sendo assim, que a câmara de ecos faça ecoar esses meus versos e principalmente emane minha vibração.