É de uma desonestidade intelectual tremenda querer discutir cientificamente sobre as cotas e a existência das raças, como se uma porcentagem de genes definisse quem é negro. Uma pessoa que tem mais da metade de genes de origem caucasiana-européia, mas, ainda sim, manifesta fenótipos negros, terá sobre si o peso do racismo. Ninguém precisa fazer um exame de DNA em mim pra saber que eu sou negra. Esse papo de herança genética, de não existência de raças, é, pra mim, enfurecedor. Tamanha falácia.
Acho engraçado também quando eu escuto a imensa preocupação com possíveis fraudes na autodeclaração. Para negar direitos ao povo negro, a autodeclaração é tornada um óbice… Mas ser declarado negro por essa sociedade, ser marginalizado, preso, exterminado, não é problema nenhum. As cotas nas penitenciárias andam a pleno vapor e ninguém se importa com a fraude que é esse sistema perverso e racista. Quanta hipocrisia.
Ah, mas e as cotas sociais e os brancos pobres? Nós estamos aqui falando de séculos de exclusão e marginalização da população NEGRA. Chega de falar de branco! Estamos falando de mais da metade da população desse país sendo excluída da universidade e ainda ousam questionar a injustiça que é alguns dos brancos não terem acesso à universidade? Nós somos maioria na população e minoria na universidade e ainda temos que ficar pedindo licença pra entrar? Chega! Já deu!
Estamos falando de uma meritocracia fajuta, que exclui mais sistematicamente pessoas negras da universidade. Não há que se falar em mérito quando as oportunidades são desiguais. Você, branco, com seu pré-vestibular maravilhoso, com curso de inglês, francês, intercâmbio, competindo com um cara que mal tinha uma carteira pra sentar, que dirá um professor. Covardia, né, campeão?
EU estou falando de reconhecimento. EU estou falando de andar nos corredores da faculdade de Direito da UERJ e olhar os quadros com as fotos dos formandos antes das cotas e ver, no máximo, um negro pingado nas fotos. EU estou falando de nunca ter tido uma professora negra. Estou falando de andar no fórum onde trabalho e só encontrar meus iguais com o uniforme de terceirizado, trabalhando na limpeza, no elevador ou de segurança. Aliás, por isso, sou a favor de cotas não só na universidade, como no serviço público.
Já perdi a conta das vezes que debati essa questão. E já vi que vou passar muitos anos da minha vida ainda tendo que debater, rs… paciência!
“Acima de tudo, não iremos nos calar diante de qualquer ataque aos nossos direitos.”
Folha, eu discordo de você e não te sigo! Cotas sim!
8 comments
Olá,estou conhecendo o blog agora.Achei curioso esta afirmação de que ela nunca teve um professor negro.Eu tive vários,aqui no norte do PR há muitos,apesar da maior parte da população ser branca.Acredito que no BR a maior desigualdade é a desigualdade regional.A questão racial é apenas um,dos fatores que contribuíram para acabarmos nesta situação..
Pq vc também não fala, em um artigo separado, especificamente da dificuldade dos negros em arrumar empregos, sempre escutando a desculpado “vc não tem o perfil”, ou quando o tratamento pessoalmente é totalmente diferente do telefônico e de repente “a vaga já foi preenchida por alguém com mais experiência/foi cancelada”, assim, que nem um passe de mágica? Sei lá, usa algum caso verídico como exemplo e dê dicas de quais empregos seriam mais favorecidos e receptivos com a população negra, seria uma boa orientação a quem está com essa dificuldade. Eu por exemplo, demorei mais de 12 anos pra ter meu primeiro emprego registrado, mas por se tratar de um regime escravista eu o deixei em menos de 45 dias, e agora voltei a enfrentar a dificuldade de uma nova chance, e sabe-se lá Deus QUANDO irei trabalhar novamente, pois infelizmente não depende de mim, e mesmo sabendo do meu valor e competências, me sinto incompetente. Quanto a questão universidade, estudei em um privada, não precisei de cotas e o tratamento que me davam era ok.
E curiosamente, neste emprego que eu estava (atendente na Pizza Hut) a maioria dos funcionários eram negros, onde me deixaram por mais tempo em serviços de cozinha do que no atendimento em si (embora uma das gerentes também fosse negra). Será que foi coincidência??
Depois da vitória gritante no STF,não perco mais o meu tempo quem é contra as cotas. Vencemos e é um fato.
Parabéns pelo texto.
E na verdade, o que eles temem é que a cota de 100% branco em todos os setores seja derrubada. Mas já está sendo e eles terão que lidar com isso.
Diga não aos jornais pseudamente progressistas, que por baixo da capa de democrata, nega um dos direitos básicos do ser humano: o direito à educação. Abaixo os jornais herdeiros da filosofia da Klu Klux Klan, que utilizam negros embranquecidos e desinformados para falar contra o direito dos negros. Abaixo a manipulação dos inocentes. Negros e negras conscientes deste país não comprem a folha ou qualquer um dos seus produtos midiáticos. Seja livre. Diga não a quem deseja que você não tenha sempre de dizer sim!
Meu total apoio ao discurso aqui apresentado!
Estudante de Direito na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), lésbica, feminista e amante do samba e sua cultura.