A minha orientadora branca trata os(as) orientandos(as) brancos(as) de forma diferente da forma que me trata. Eu vejo o quanto ela adere às ideias deles mais facilmente do que as minhas, além dos elogios motivados por qualquer coisa que eles façam e da voz carinhosa que faz pra cada um. No mínimo, meus/minhas colegas brancos(as) recebem uma hipervalorização que só é possível pelo pacto da branquitude que é silencioso, pois se consolida por ações.
Decidi questioná-la, sim, foi uma decisão! No entanto, ela foge de mim como quem vê o diabo. Evita qualquer conversa que possa confrontá-la e oferece uma simpatia superficial a fim de apaziguar os meus ânimos, as minhas ideias, sobre suas ações. Antes, eu achava que essa percepção das atitudes dela eram paranoias de quem não está acostumado a ser bem tratado, contudo, foi se comprovando ao longo do tempo. Eu a apresentei a uma amiga branca, gente boa, imediatamente a minha orientadora se simpatizou. Depois de um tempo, na convivência diária com essa minha amiga, percebi que aquilo que a professora não fazia por mim, fazia por ela, apesar dos poucos dias que se conheciam. Respondia às mensagens dela com prontidão, até o tema racismo a orientadora conversava com essa minha amiga. No entanto, comigo, o diálogo sobre racismo sempre era evitado. Ainda, minha orientadora se diz a especialista em questões raciais, feminismos e decolonialidade. É só teoria! Aliás, teoria brancocentrica.
Eu tentei várias estratégias para me aproximar e deixá-la à vontade para que eu pudesse abordar as questões que me afligiam. Usei do bom humor, imitei os discursos vazios de alguns colegas brancos bajuladores, mas nada. Independente das coisas que eu dizia, o meu corpo continuava preto. Depois de muitas tentativas, eu desistir de ter proximidade. Entendi que minha pesquisa não contará com nenhum segundo de diálogo com a orientadora, ela só receberá os louros e, como já tem feito, usado o meu corpo e a minha pesquisa para dá legitimidade ao seu lattes, ou seja, transformando-me em um objeto epistemológico e não em um sujeito.
Meus/minhas colegas brancos(as) não se incomodam de serem tratados como objetos, pois isso lhe abre espaços, possibilitam, um pouco, o exercício de voz e intelectualidade. Diante dessas percepções, eu me pergunto: há orientadores brancos não racistas? Vou focar nas mulheres brancas, porque são elas que eu me deparei na minha trajetória acadêmica, tanto no Brasil como fora.
Mulheres brancas acadêmicas não renunciam ao sinharismo? Não vou generalizar, mas nesses onze anos de trajetória acadêmica, digo que a maioria das mulheres brancas que eu conheci, apesar das teorias que levantavam bandeiras, eram racistas. Além disso, algumas eram dotadas de incoerência, já que nos espaços públicos com seus discursos de inclusão eram recebidas como aliadas. Entretanto, no âmbito mais privado, por exemplo, no momento da orientação ou em sala de aula, eram o cúmulo da colonialidade.
Tais mulheres brancas andavam com mulheres negras com prestígio acadêmico, participavam de eventos sobre questões raciais e decolonialidade, porém, mesmo assim, optavam por exercer um poder racista nos corpos negros nos ambientes onde a coletividade não as ver. Minha orientadora é uma dessas pessoas. Ainda, ao se colocar como detentora de mediunidade, se coloca como o ser humano mais abençoado desse mundo. A mediunidade lhe revela tudo, menos o seu racismo. Sobre as suas crenças, se apresenta ecumênica, apesar de frequentar casas espíritas, ama o terreiro, ama a umbanda, porque, segundo ela, sua criação foi toda voltada para a diversidade.
Apesar da criação, nada a ensinou a ser sensível a minha presença e a minha voz. Nada lhe permite reconhecer as reiterações do racismo, pedi perdão e se autopropor mudanças. Ela performa artificialmente um senso inclusivo enquanto sustenta seus privilégios raciais. Infelizmente, eu tentei nessa convivência acreditar que mulheres brancas poderiam ser positivas em minha formação acadêmica, no entanto, elas nunca foram, não sei se um dia serão.
As relações acadêmicas são brancocentricamente coloniais, professoras negras quando possui um discurso ativista também são tratadas com menosprezo e lhe boicotam em tudo. Nesse texto, deixo um recado para as orientadoras brancas: se não há escuta, não há decolonialidade em sua prática docente. Observe suas ações, aceite ser questionada e abra-se para o diálogo, não digo que isso é fácil, mas possibilitará uma convivência melhor com aquilo que mais temem: vozes negras ativas.
Orientadoras brancas transformam a relação de orientação em dominação, quando não conseguem dominar, se frustram a ponto de serem extremamente violentas. No meu caso, a violência da minha orientadora é extremamente sorridente, ela me ignora em contextos que ela não ignoraria as orientandas brancas. A academia transforma essa relação em algo eterno, já que irei ser associada a essa racista para o resto da minha vida. Todavia, eu decidi que assim queeu terminar o meu doutorado, não falarei o nome dela jamais. Se me perguntarem, eu invento algum nome e sorrio.