O que é ser uma nordestina, negra morando no Sul do Brasil? Para mim representa a inserção em uma cultura totalmente distinta, fazer parte de grupos com os quais nunca tive experiências de convívio, aprender com eles, aumentar minha bagagem cultural e circular como uma cidadã comum, igual a todos.
O que tem sido? Um misto de dicotomias quando o assunto é a minha origem regional e racial em uma cidade que, embora miscigenada, ainda é marcada pela cor e pela frieza europeia. Se por um lado sou notada pelo sotaque “bonitinho”, pelo cabelo natural que na condição de natural nem deveria ser motivo de admiração, desperto a curiosidade pelo diferente, pelo que “vem de longe”.
Se o problema é identificar o racismo dentro das suas atitudes, um bom começo é se colocar no lugar do outro e concluir que ser notado por algo que é da sua natureza com tamanha admiração o obriga a retomar a soberania sobre sua origem. Isso é um processo diário, cansativo e desnecessário.
Olhar para dentro de mim e perceber que eu, assim como qualquer ser humano, sou um ser subjetivo e que a construção da minha personalidade é única, não importando de onde venho e para onde vou, ao mesmo tempo que sou questionada, abordada, obrigada a perceber-me como distinta é muito mais que discriminatória, é constrangedor e triste.
Nas raras ocasiões em que me expresso sobre o assunto, tenho a esperança que o discrimador se reconheça como tal, mas o que o caracteriza está justamente na não percepção dos seus atos.
Falo “raras ocasiões” porque expressar minha insatisfação não faz parte da minha aceitação. Cabe a mim a ousadia de me empoderar neste ambiente, abrindo espaço para que mais negras nordestinas possam se sentir a vontade para fazer o mesmo.
Imagem destacada: Mc Tish Hyman – Page Afropunk