De início, é importante frisar que, ao que se refere à escrita acadêmica de pesquisadores negros em formação nas pós-graduações pelo Brasil, observamos um mecanismo de controle potente, em que tais pesquisadores são obrigados a usarem teorias de intelectuais brancos que pouco explicam o seu objeto de estudo ou que, na maioria das vezes, reiteram racismo e impõe um universalismo branco no que tange o social, a literatura ou a língua.
Esses dias vi nas redes sociais um texto que me chamou atenção, escrito pela Elvira Swatch Lorenzo, no site Afrofeminas, que tratava sobre a política de respeitabilidade. Segundo a autora, essa política é uma “regra não escrita que as pessoas marginalizadas e as minorias devem seguir para ganhar o respeito na cultura dominante” (LORENZO, 2022 – Tradução minha). Diante disso, comecei a refletir sobre o espaço acadêmico e o quanto essa política atua nele, não como um acordo de convivência social, mas como um mecanismo de subordinação das produções de pesquisadores(as) negros(as), dado que essa política para os brancos é sim uma política de conivência em que todos estão no mesmo barco privilegiado, só que, para as pessoas negras, ela é uma política danosa para o desenvolvimento pleno da nossa intelectualidade e, por conseguinte, da nossa produção intelectual nesses espaços.
Ainda, podemos observar o quanto que nossas reflexões intelectuais são relegadas ao plano da” informalidade”, pois na impossibilidade de exercemos nossa liberdade epistemológica na academia, exercemos-na em outros espaços que não são reconhecidos até mesmo quando há registros em vídeos. Nesse sentido, observamos a intelectualidade negra se desenvolver no plano da oralidade do que na escrita, o que é algo positivo, contudo, nós vivemos em uma cultura que respeita demais o escrito, então, ao nos impossibilitar de existir, cognitivamente, no plano da escrita, a branquitude continua vencendo em termos de narrativas e controle discursivo.
Sabe-se que o controle discursivo também atua nas revistas acadêmicas, assim, as produções que não se adequam a perspectiva brancocentrica das mesmas dificilmente são aprovadas. Então, como trazer nossas reflexões produzidas na oralidade para a escrita? Uma saída tem sido a organização de e-books por/pelas intelectuais negros(as), os quais são disponibilizados gratuitamente para o público-leitor. Independente disso, considero ser relevante acrescentar essas produções da oralidade, cujas gravações são disponibilizadas em redes sociais e You Tube, nos nossos textos acadêmicos apesar da grande rejeição que recebem.
Esse caminho de construção de uma escrita acadêmica de perspectiva preta é tortuoso e dolorido. Por ela, tenho pagado um alto preço, o qual não me arrependo, todavia, queria uma academia onde nossa voz, escrita ou falada, não tivesse que passar por tantos empecilhos impostos por racistas, assumidos ou não, tanto de direita como de esquerda. Enfim, cada palavra que escrevemos ou falamos é um ponto para Exu. Não se esqueçam que nossa voz é a oferenda no nosso corpo-encruzilhada. Não se calem, escrevam e falem.