Por Mara Gomes para as Blogueiras Negras
Hoje o dia se iniciou até com o cheiro de um dia histórico em Porto Alegre, as pessoas estavam tensas, com um leve receio e ao mesmo tempo com a vontade de ver uma revolução acontecer. Mesmo o dia estando nublado e com um friozinho, nossos corpos de tão agitados não sentiram a força do vento. Todos estavam revoltosos por dentro, com aquela dor acumulada do fim de semana no peito, loucos para gritas nas ruas, pra colocar pra fora o peso das injustiças, das ignorâncias, das tristezas… Cansamos do silêncio e decidimos sair da inércia. Por isso o dia não terminou calado, às 18h mais de 10 mil pessoas tomaram a frente da prefeitura de Porto Alegre, depois seguiram em um ritmo caloroso unido com seus gritos ecoantes pelas ruas e avenidas “Ôô o Brasil parou, o Brasil parou!” Lá no meio eu não enxergava o fim nem o começo da marcha, só se avistavam pulos, só se ouviam cantos, só se sentiam arrepios. A revolução está chegando, nunca vi uma coisa tão linda dessas acontecer antes e o que se sente lá no meio é inexplicável.
Tudo estava correndo muito bem até que chegamos à Avenida Ipiranga, essa que é cede da emissora RBS, uma das maiores emissoras da cidade e filiada mais fiel da nossa querida Rede Globo, obviamente a polícia não nos deixaria chegar nem um milímetro, mesmo que nossas intenções não tivessem nenhum sinal de maldade. Foi aí que a repressão começou. Bombas de efeito moral voaram sobre o povo, estrondos fortes tentaram calar a nossa voz, de onde eu estava se pedia: -“Não recuem! Não se dispersem!” Porém as bombas foram se aproximando, por motivo nenhum elas não paravam de se aproximar. Mas em nenhum momento ouve alguma violência que propiciasse aquele ataque repentino, duas amigas minhas estavam paradas e receberam uma bomba de efeito moral nos pés, o resultado foi a garganta ardendo, os olhos lacrimejando, o rosto ficando inchado. Por que essa violência toda? Gritávamos “Sem violência!”, mas nenhum resultado foi alcançado, fomos obrigados a recuar enquanto as bombas ainda nos seguiam. Essa repressão me passa um sentimento de impotência, parece que sou incapaz de fazer qualquer coisa pra mudar, pra ultrapassar essa barreira de brutalidade que nos cerca, que nos oprime diariamente.
Esses movimentos todos servem para nos mostrar que essa violência que a polícia usa contra os manifestantes é a mesma usada dentro da favela todos os dias, contra as minorias que são abrigadas a viver sob o descaso do Estado. O destino dessas balas de borracha, dessas bombas de efeito moral, desse medo, deveria ser dirigido para o Estado. É ele que oprime, é ele que machuca e mata todos os dias, tratando com uma agressão desumana a população. Tenho medo toda à vez que saio na rua para um novo protesto, mas mesmo assim meu grito não vai se calar tão facilmente, porque estamos acordando pouco a pouco, 100 mil no Rio de Janeiro, 65 mil em São Paulo, 35 mil em Belo Horizonte… Além de outras tantas cidades do Brasil e do mundo na luta também. Não vou me calar agora, estou muito extasiada para fazê-lo. Também não calo porque já sinto o cheiro de flores, a nossa primavera brasileira já começou e ela com certeza será próspera. Por isso não há mais lugar para o medo desse lado da luta.
Mara Gomes administra a página A mulher negra e o Feminismo.
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