Apesar de ser totalmente alheia as séries, fui impactada pelo grande alarde relacionado a série Dear White People (Queridos brancos) promovida pela NETFLIX que teve sua apresentação nesta última sexta-feira 28 de abril. A série é parte do filme de Justin Simien que questiona as dificuldades de ser negro (a) no mundo que é dos brancos. As redes sociais inflamaram quando houve a divulgação do trailer, a quantidade de pessoas a promover suas famosas aversões contrárias a série reduzidas ao famoso e tolo hashtag, apontou a importância do debate profundo acerca da questão racial.
Na internet impressionou a quantidade de pessoas incomodadas em ver negras (os) a protagonizarem o seu cotidiano de discriminações e violências de todas as ordens. As refutações contrárias a série foram pífias a exemplo de um dos comentaristas que escreveu: “é uma série anti branco” Tão banal que não vale a pena escavar, tendo em vista que toda a mídia é maioritariamente branca!!! Mesmo no Brasil, onde mais da metade da população se declara negra. Em uma mídia que não reflete a realidade do seu povo este tipo de argumento é tão raso que é melhor deixar para os likes egoícos de plantão.
Tratar da questão racial no mundo dos brancos parece ser um debate já superado, entretanto, ele nunca existiu. O sucesso da série, que é uma comédia, sem deixar de ser crítica, revela esse ponto ao mostrar a trama da vida de jovens negros em um contexto universitário norte americano. Obviamente que nesta sociedade capitalista o racismo é estrutural, bem como machismo são opressões que se entrelaçam, logo muito do que aparece ali já foi vivenciado por mim, ou por muitas das mulheres e homens negros que conheço. Mesmo na distância que nos separa de determinados países, temos sofrimentos que nos unem, os da exclusão, da pauperização que é desigual e também combinada em cada contexto. A meu ver, foi triste e enternecedor ver que pela primeira vez alguns dos meus dilemas apareceram em uma série e desta vez não era de forma rebaixada, mas sim como protagonista na nossa luta, que vai além do mundo universitário exposto pela série.
Luta que vai para além- mar, já que mesmo longe, acompanhei os brasileiros no dia 28 de abril histórico. O momento o povo saiu novamente às ruas contra o retrocesso de um (des) governo que tenta retirar o que já não temos. Foram àqueles que muitos dos governantes chamaram de vagabundos ou vândalos sorte a nossa que existam tantos vagabundos e vândalos, são eles que conquistam o que nos é retirado, que exacerbam os conflitos quando não aguentamos mais padecer.
É chegada a altura de percebermos que o mundo não é um mero espetáculo. Somos nós os atores e sujeitos desta trama e o 28 nos lembrou disso, seja por meio da ocupação ou da repressão violenta do Estado. Agora já há um certo desconforto dentro de nós, uma inquietude que nos coloca a seguir, sem saber o que nos espera. Sair da consciência isolada é isto! Nos colocarmos a disposição para desvelar aquilo que nos ocultam. A condição de subalternidade é nossa e ao que parece somos nós que teremos que arrancar do Estado a sociedade em que queremos viver e queremos construir.
Explicitamente não será aquela em que ricos se alimentam, sem qualquer opróbrio, em um local chamado “senzala” que é historicamente o local onde dormiam e sofriam arduamente os negros. Toa uma sensação que a burguesia necessita de aulas de história, estão a tripudiar no sofrimento alheio da maioria brasileira.
Conquanto, agora se mostram aborrecidos no cinismo porque quebraram vidraças do suposto comedor, todavia, esse assunto eu não aprofundarei porque quem não sabe o que significa “senzala” também não deve conhecer a dialética que quebra muros e tijolos. Paremos de reproduzir esse senso comum de cunho racista, arrivista, machista contra o pobre. Não há disfarces mais, as cortinas se abriram e a população é sabia e terá a coragem perturbadora da ordem sempre que for necessário.