Escrever sobre Antonieta de Barros vai além da admiração. Trata-se de reverenciar a capacidade de uma mulher negra que ultrapassou as barreiras do racismo, sexismo e do preconceito social e cultural da classe dominante, em plenos anos 30.
Professora, escritora, política, ativista dos direitos civis, Antonieta de Barros nasceu em Florianópolis em 11 de julho de 1901. Sua vasta produção intelectual, com ênfase na educação, fez dela a mais respeitada e homenageada afrodescendente não só de Santa Catarina mas do país.
Filha do jardineiro Rodolfo de Barros, falecido quando era menina, e de Catarina de Barros, Antonieta é nome de rua, auditório, medalha, escola, selo dos Correios e túnel. Desconstruiu as previsões sempre negativas sobre as perspectivas futuras da mulher negra sendo percussora da luta de políticos negros no parlamento, movimento reprimido pela ditadura militar, mas que ganhou força a partir da Constituinte de 1988. Contribuiu, ainda, para as discussões sobre a participação da mulher num espaço, ainda hoje, eminentemente masculino.
Em 1934, envolveu-se no debate sobre direitos civis, sociais e políticos, defendendo particularmente o direito das mulheres ao voto. Antonieta não era feminista, mas defendia a independência da mulher como forma de conquistar cidadania e respeito. Nesta época, foi eleita como a primeira deputada negra de Santa Catarina pelo partido Liberal Catarinense (PLC).
Apesar da intensa participação na política, em toda sua vida a educação ocupou espaço especial. A infância pobre, a mãe era doméstica e graças ao seu trabalho, Antonieta de Barros ingressou, aos 17 anos, na Escola Normal Catarinense, formando-se em 1921, professora de Português e Literatura. Lecionou Português e Psicologia no Colégio Coração de Jesus, no colégio Dias Velho e no colégio Catarinense. Um ano depois de formada, fundou o “curso particular Antonieta de Barros” voltado para a população carente. Foi diretora do Colégio Dias velho e do Instituto de Educação, no período de 1937 a 1945. Em diversos discursos dizia que a educação era o cominho para o futuro. “Educar é ensinar os outros a viver, é iluminar os caminhos alheios, é amparar debilitados, transformando-os em forte, é mostrar as veredas, apontar as escalas, possibilitando avançar sem muletas e sem tropeços, é transportar as almas que o senhor nos confiar, à força insuperável da Fé”.
Acreditava que a cultura era o único caminho para subir na vida o que somente seria possível pela educação, o que na época era acessível a poucos. Devido a esta crença, passou a vida lecionando, escrevendo, participando de associações tornando-se cada vez mais visível numa sociedade que tendia, e ainda tende, a invisibilizar mulheres e homens negros. Ser professora era seu principal talento, mas dedicou-se também ao jornalismo. Em 1926, fundou o periódico “A Semana”, colaborou no jornal “A república” de 1931 a 1936, escreveu crônicas sob o pseudônimo de Maria da Ilha. Publicou o livro de crônicas “Farrapos de Ideias”. A renda da venda do livro foi destinada ao abrigo dos filhos de leprosos da colônia “Filhos de Lázaro”.
“Antonieta circulava junto às elites locais, fosse como professora e, a partir de 1925, como a primeira secretária da Liga do Magistério e integrava o Centro Catarinense de Letras, agremiação que tinha nomes importantes da intelectualidade e da política catarinense, fato quase impossível para uma mulher negra numa época em que as oligarquias revezavam-se no poder e a política era “coisa de homem”, é algo extraordinariamente inédito”. Revela Karla Leonora Dahse, doutora e coordenadora do curso de Especialização em História Militar da Universidade de Santa Catarina.
Antonieta de Barros morreu jovem, aos 51 anos, solteira e sem deixar filhos, mas deixando a para nós, mulheres negras, a lição de que “não se entra na luta trazendo somente um amontoado de sonhos e o desejo de realizá-los. É preciso que se queira a sua concretização e que se saiba querê-la. Para tanto, porém, se necessita de arma. Toda ação requer instrumento. E o instrumento máximo da vida é a instrução”.