Por Hanayrá Negreiros para as Blogueiras Negras
A princípio, esse seria um texto sobre ter cabelos crespos, mas achei que já haviam textos demais sobre isso. Então resolvi pensar na minha atual situação, uma ex- careca deixando os seus cabelos crescerem novamente.
Quando comecei a pensar em ter cabelo de novo, fiquei em dúvida várias vezes, resolvi raspar o cabelo porque estava cansada de mim mesma. Usei trancinhas de todos os tipos por anos da minha vida, e agora constato que de alguma forma, as minhas trancinhas me deixavam dentro de uma zona de conforto, onde eu não me atrevia a usar o meu cabelo de outra forma. Resolvi usar o cabelo solto, Black Power, mas queria que o meu cabelo fizesse cachinhos, coisa que ele não faz naturalmente, porque ele do tipo crespíssimo. De 2 em 2 meses eu estava ali, passando creme relaxante para “soltar” as raízes, achando que ele iria cachear. E até cacheava, mas não era natural. Não era o meu cabelo.Resolvi um dia então, depois de muito pensar, pedir opiniões de diversas pessoas, cortar tudo, raspar e ficar careca. E assim foi. E foi a melhor coisa que já fiz, percebi que para ser bonita ou feminina não é obrigatório ter cabelo grande.
Fiquei careca por um ano e meio e agora me vejo com a vontade de deixá-lo crescer de novo, mas agora diferente, com outro pensamento, de que eu não preciso “soltar” as minhas raízes crespas para que o meu cabelo fique diferente. Me pego sempre passando a mão nele para entender como é que ele funciona, tinha me esquecido da textura, de como ele cresce, que ele parece ser mais curto do que realmente é. Começo finalmente a [re]conhecer o meu cabelo.
Começo também a perceber o que está a minha volta, mulheres trocando informações sobre seus cabelos, passando pelo processo de “encrespamento” e se libertando. Ainda acho difícil deixar ele crescer, não tem muito o que fazer com 3 cm de cabelo, difícil relembrar que ele é crespo demais pra cachear, que a textura dele é mais rígida. Deparei-me com a segunda constatação: de que não ter cabelo, usar ele raspado, tinha me colocado dentro de outra zona de conforto, a da praticidade. De não ter de me preocupar com as hidratações, penteados e afins. Por outro lado me vejo encantada por ele de novo, tenho mil ideias pra quando ele estiver grande, penso nas tranças novamente, mas agora sem o medo de tirá-las, penso em tingir, em fazer birotinhos, feito aqueles que a mãe da gente fazia quando éramos pequenas e o plano agora pra quando ele estiver bem maior, é fazer dreads lindos, e depois raspar de novo!
Por fim, cheguei a terceira e última [até agora] constatação, que não adianta ficar com medo de mudar, de cortar, de encrespar. Mude quando quiser. Meu cabelo agora ao final desse texto está com 3 cm e pouquinho. Já dá pra trançar. Quem sabe não mudo de novo?
Vem cá, 3 projetos crespos que inspiram:
- Meninas Black Power: Coletivo que através de ações educativas, uma fan page e um blog, traz um mundo de crespas, crespos e crespinhos, com todos os tipos de cabelos possíveis e imagináveis.
- Projeto Raiz Forte: Projeto que mostra através de um documentário, como meninas e mulheres de raiz forte [crespa] lidam com os seus cabelos.
- Manifesto Crespo: Coletivo que tem como foco central a discussão sobre como o cabelo crespo pode e deve ser encarado de uma forma criativa, fazendo com que se desmistifique a ideia de que existe cabelo “ruim”.
16 comments
Amei seu texto amiga, estou passando por esta fase, usei mega por dez anos e agora meu cabelo caiu todo, estou de um lado careca, e com teu texto estou tomando coragem para raspar meu cabelo pois só fiz besteira nele, alisei e esta caindo…tenho medo mas vou seguir adiante…
linda linda linda!! Amei o texto, o cabelo, tudo! Já cortei meu cabelo muito curto pra tirar a progressiva. Foi um custo, ficou horroroso um bom tempo, mas depois ficou lindo de novo, agora não largo por NADA! Parabéns viu? Beijos!
Haynará, amei seu texto. Não sou negra, mas tenho muitos amigos e alunos negros. Vejo muitas meninas passando por isso. Sempre digo pras minhas alunas esquecerem totalmente o padrão e deixarem o cabelo como quiserem. Aí eu ouço “professora, mas a senhora é ruiva, branca, tem cabelo bonito e bom.” Eu digo que meu cabelo élindo sim, mas e o delas? Que são cabelos lindos também? Elas tem que acreditar que é lindo (pq amo cabelos cacheados, crespos e black). Num tem essa de cabelo bom e ruim. Cabelo é cabelo, é parte da nossa identidade estética e a gente deixa como quiser!
Romina, fico super contente por ter gostado do meu texto! É muito bom que as crianças tenham uma professora consciente, a gente tem que ensinar os pequenos e os grandes nas escolas e em todos os espaços que pudermos!
Beijos!
Q texto fofíssimo!! Fiquei aki sorrindo com todas as suas idéias pro seu cabelo!! kkkkkkk
Oi Li!
Fico contente por ter gostado do meu texto!!! Acabei cortando ele de novo! haha
Gostei do texto…identifiquei-me com ele. Também deixei de relaxar e fiz um corte bem curto. Fui cortanto aos poucos e hoje ele está todo natural. Para mim, foi um resgate de mim mesma: Saber como o meu cabelo realmente é e gostar dele assim. Acho que a aceitação do cabelo crespo passa questão racial (em virtude da opressão que sofre o negro e tudo o diz respeito a ele, como a sua estética), mas vai além disso. Acho que a mensagem é a seguinte: Devemos, todos nós, brancos, pretos, magros, gordos, etc, perceber que somos únicos. é essa singularidade que me faz especial. Cada uma, na sua singularidade, possui uma beleza que lhe é peculiar, única. Somos marcados pela diversidade numa sociedade que insiste em padronizar tudo…Enfim, a beleza vem de dentro. Me sinto muito mais feliz, muito mais segura e muito mais bonita com o meu cabelo assim, do jeito que ele realmente é…É completamente libertador!
A identidade é uma das coisas mais valiosas que temos, saber quem somos é libertador! Fico feliz por ter gostado do meu texto!
Um beijo grande!
Haynará, esses dias numa livraria encontrei um livro infantil que me fez chorar: “O cabelo de Cora”, da Ana Zarco Câmara. É lindo, tem ilustrações fofíssimas e desenvolve competentemente o processo de reconstrução da autoestima depois de ouvir das amiguinhas que o “cabelo é ruim”, tanto a identificação com a família e as raízes. Recomendo pra todas agora, só posso esperar que todas as professoras deste mundo passem esse livro para os alunos, pra ver se torna menos dolorida essa fase delicada.
Laila, é muito importante mesmo ensinar e mostrar para as nossas crianças como o nosso cabelo é bonito. Se a gente fizer isso com elas, elas crescerão acreditando nisso! Esse livro deve ser lindo mesmo! Beijos!
Eu não tenho muita certeza se é legal chamar a praticidade de um cabelo feminino de zona de conforto. Na lógica ocidental, a beleza é uma ditadura machista e racista que, entre outras coisas, prevê que nós, mulheres, não temos o direito à praticidade. Desde a nossa indumentária, cuja função simbólica está acima da funcionalidade, até o trato com o corpo, esse padrão afasta necessariamente a praticidade de nós, em troca de olhares masculinos – embora eu não ache que é o caso da relação que rola entre uma mulher negra e seu cabelo. Mas sei lá, só tô divagando =P
Obrigada pelos comentários meninas! Se sentir livre para ser feliz. Carmen, entendo seu ponto de vista, mas no caso a minha zona de conforto era o meu cabelo. Bora trocar mais ideia!!! Beijos!
Lindo texto, amei saber de suas mudanças!
Esses relatos nos inspiram!!
Fiquei 14 meses em transição (pouco mais de um palmo de raiz) e estava desesperada pra cortar! Foi um alívio tão grande!
É uma sensação maravilhosa quando agt se aceita como é!
Adoro esse blog! Parabéns!
Fica aqui meu convite para visitar o meu 🙂
http://www.deboraninja.wordpress.com
Um grande beijo
Obrigada Débora!
Lindíssimo texto!
Também me seinti muito assim… sobretudo na parte de passar a mão nos cabelos e sentir a sua textura, que eu já havia esquecido como era.
Parabéns pelo texto… Beijo!
Obrigada letthyssia!!!! Beijos!