* Esta resenha é do livro Poesia em primeira pessoa escrito pela poetisa Francielle Costacurta a ser lançado em janeiro, pela Editora Ceos.
A temida depressão, ela que vai e volta. Depois de anos convivendo com os seus sintomas, que gosto de chamar de “feridas na alma e dores psicológicas”. A gente aprende algumas habilidades para melhor conviver, com esse estranho que nos paralisa e entristece. Do contrário pessoas felizes, contentes como vivem o tempo inteiro, são muitas vezes insensíveis às dores e opressões de quem está ao seu lado. Agora o depressivo, a cada sopro seus espinhos se ouriçam, e a sensibilidade torna-se muito grande. São detalhes, possibilidades que enxergamos quando estamos sem crise. A reflexão e o auto conhecimento, vem com mais força, independente da idade das pessoas. É parecido com estar apaixonado, a cada música romântica, achamos uma mensagem secreta para nós. Ou uma grávida estar próximo do trabalho de parto, ou estar enfrentando um diagnostico de câncer. É nesse momento, que notamos como é importante a vida própria, a vida de outros seres humanos. O olhar muda, a percepção e o cuidado com os outros também.
Existem cuidados mentais feitos em diários, que são relatos do cotidiano. E que quando combinados com outros pareceres de leitura, outras experiências, podemos flexionar o verbo, numa auto reflexão. Essa ação é passível de ser feita através da poesia. Uma válvula de escape, para tanta opressão. Em um mundo onde é feio mulher falar alto, responder a altura do agressor, que se justifica pelo fato que é “superior” na hierarquia afetiva, no ambiente de trabalho, sobre a idade, na escola. Em outros momentos da consciência, o atingido chega a mapear, as fragilidades do sistema, e montar narrativas irônicas de quem o atinge. E ainda em outros momentos, se esquece que esteve em surtos de pânico severo e se deita a cabeça na cama e aproveita a tranquilidade, deixando a culpa de lado, e aproveitando toda a viagem. Curtindo um hip hop que imita as batidas do coração, contemplando toda a paisagem e cada momento que se pode propiciar a alegria, o equilíbrio, sabores e experiências novas.
A regra não é única, nem todo psicótico depressivo é poeta, nem todo esquizofrênico é pintor. Alguns passam por fases que perdem a autonomia, e que podem reconquistar ou não. E nem toda a pessoa sofrida consegue dar a volta por cima, pela força do pensamento como diz o livro “O Segredo”. Mas o poder de ter auto disciplina, na pesquisa e descrição das próprias dores. Torna cada recordação memorável, e não há o que limite a força dos versos, eles ainda podem didatizar cada sentimento em gestos de solidariedade de quem passa pela depressão, de épocas e modas, que foram muito mais que consumismo e frustração, foram amores e prazeres, registrados em prosa e poesia. Daqui a cem anos, a nova geração vai ver que uma representante da espécie humana, chamada Francielle Costacurta, cumpriu uma função social isto é fez a demonstração da arte da retórica, poética e politica na realidade que se viu inserida. Além da prática mecânica de viver, filhos, marido, dinheiro no banco. Desta vez sem demandas prescritas por pais, professores e chefe de departamento da universidade, eu escrevi a minha poesia em primeira pessoa. E lanço esse livro, como um desafio, de ter a minha subjetividade à mostra, trabalhada em flagrantes de momentos de emoção, pequenas coisas que podem ser grandes e importantes. Para quem ainda pode escrever muitas e várias auto biografias pela frente.