por Stephanie Ribeiro publicado originalmente em Os Colunaveis
Interseccionar é compreender que não existe uma única opressão, mas que essas estão interligadas. É ter um olhar mais profundo sobre as desigualdades sociais e os grupos marginalizados existentes e saber que enquanto um não for livre, nenhum será, mesmo que as lutas sejam distintas. Eu, mulher negra e pobre, protagonizo algumas lutas porque vivencio elas, como a luta das mulheres, dos negros e de classe. Fato é que isso não me impede de APOIAR outras que não protagonizo, como a LGBTs e a dos servidores públicos com enfoque para os professores, um dos assuntos mais comentados no momento devido as ações violentas cometidas contra professores grevistas no Paraná.
Não, eu não sou professora, no máximo aluna, e ao longo da minha vida de estudante de escola pública presenciei de longe todas as dificuldades encontradas pelas pessoas que se dispunham a me ensinar mesmo em salas super lotadas, sofrendo assédio moral, agressões verbais e até físicas de alunos.
A greve dos professores já vem se arrastando há algum tempo, sendo silenciada e combatida com violência. É fato que a classe recebe baixos salários. Atualmente, o salário médio do docente da educação básica no país é de R$ 1.874,50 reais. Por decreto do governo do estado de SP (ALCKIMIN – PSDB), um professor readaptado ou de licença saúde, não pode pegar a jornada máxima de aulas. Sendo assim são obrigados a pegar apenas 24 aulas, o que resulta um salário de 1.244,00 reais, sem gratificações de magistério e sem o auxílio alimentação. Em média um professor estuda 4 anos e passa por toda aquela situação maçante do ensino superior, meritocratica, tarefista e limitadora, para quando conseguir um emprego ter uma realidade estressante, abusiva e mal remunerada, que tem como consequências danos psicológicos e até físicos.
Mas o que eu tenho a ver com isso?
Sou feminista negra interseccional.
E ai que, primeiro, é fato que no Brasil mulheres ganham bem menos que homens em qualquer emprego. Relacionando isso com a situação da remuneração dos professores, a maioria dos que lecionam no ensino de base são mulheres. No Brasil, a proporção é de 8 mulheres para cada 10 professores. Ou seja, uma profissão que exige ensino superior que é vista como tipicamente feminina pela sociedade machista, tem um dos piores salários do país, sendo metade do ganho dos outros profissionais com ensino superior.
A prova que isso está intrinsicamente relacionado é que profissões que são vistas como tipicamente masculinas, pela sociedade patriarcal, opressora, machista, possuem salários acima de toda a média, exemplo: Engenheiros.
Segundo que no Brasil o ensino público atinge a população de crianças/adolescentes em sua maioria negra e/ou pobre. Lutar pela emancipação do povo negro é ter em mente que professores participam ativamente da formação e transformação social. A sua atuação profissional é talvez uma das únicas que consiga agir diretamente na prática social de diferentes seres sociais. Professores emponderados, resultam em um trabalho de emponderamento, não só pra maioria da sua sala de aula que tende a ser negra e de mulheres, duas categorias que representam juntas a maioria absoluta em piores condições sociais no pais, mas para o país como um todo.
E em terceiro, o apoio a greves é sem dúvidas um fato que deve ser mais trabalhado em torno da militância, principalmente a virtual. Greves são um exercício de participação política e coletividade.
Não é qualquer categoria profissional que vai pras ruas reivindicar seus direitos, mas aquelas que não só são marginalizadas e concentram um grande contingente, uma característica constante nas profissões onde a exploração é uma certeza. Não existem só operários na luta de classes. Existem domésticas, garis, professores, uma população marcada pela exploração racial e de gênero, num país machista que carrega quase 400 anos de escravidão nas costas como se não fosse nada, recorte que muitos que dizem ser pela luta de classes se esquecem.
Eu apoio a luta dos professores, por esses motivos, só que principalmente porque no mercado de trabalho enquanto mulher e negra eu represento os menores salários; a exploração de anos de trabalho escravo; a maioria nos empregos insalubres; a mão de obra que mesmo que tenha mais estudos que pessoas brancas; pode perder o emprego por não ser “apresentável”, etc. Na luta por direitos, a dignidade a minha interseccionalidade existe, pois me vejo no outro.
Feliz primeiro de maio.
*imagem original Miro Medium