Por Juliana Gonçalves para as Blogueiras Negras
Fomos educadas para respeitar mais ao medo do que a nossa necessidade de linguagem e definição, mas se esperamos em silêncio que chegue a coragem, o peso do silêncio vai nos afogar.
Audre Lorde
Há sete meses resolvi ler e estudar sobre a afetividade negra. Dos meus estudos nasceram dois textos (leia aqui e aqui), algumas ideias para outros textos e muitas inquietações. A minha principal aflição é sobre o silêncio que paira no ar quando se tenta discutir abertamente o cunho político do amor e das subjetividades expressadas nas relações afetivas.
“O amor é importante porra”, é a frase que mais li esse ano nos muros da cidade. Escritoras feministas negras brasileiras e estrangeiras já pontuavam a importância do amor e a necessidade de um debate sobre a construção das subjetividades negras. Lélia Gonzales, bell hooks*, Beatriz Nascimento, Alice Walker e tantas outras escreveram algo sobre isso. Mesmo assim, é latente a sensação de que o contexto político do amor é relegado como algo de menor importância.
Para além do processo de escravização vivido pelos nossos antepassados que afeta até hoje a nossa subjetividade e a maneira pela qual nos relacionamos, há um contexto social que exige atenção.
Creio, por exemplo, ser de extrema urgência hoje cuidar das mulheres negras mães e viúvas dos milhares de jovens negros que são mortos e encarcerados Brasil afora.
Como ignorar também o feminicídio de jovens mulheres negras que ocorre no país? Segundo dados do IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada -, entre 2001 e 2011, cerca de 50 mil mulheres foram mortas. Dessas, 61% eram negras. Ainda de acordo com o instituto, 40% de todos os homicídios de mulheres no mundo são cometidos por um parceiro íntimo. Nenhuma dessas mulheres foi vítima do amor, mas sim, óbvio, do machismo, mas não só dele.
Acredito que há uma série de fatores que influenciam nesse número tão elevado de mortes femininas negras. Entretanto, vejo esse quadro perverso como uma manifestação evidente das relações de poder existentes dentro das relações afetivas aliada à permissividade maior que se tem com o corpo negro.
Seria muito interessante e necessário ter espaços onde mulheres e homens negros pudessem discutir abertamente suas subjetividades e construções afetivas pela ótica do processo coletivo que vivemos.
Um momento para desdobrar essas e outras situações que afetam a subjetividade de nós negros. Ou seja, é urgente incluir os homens negros nesse debate.
À procura de amor e respeito
Em 1967, a escritora estadunidense Alice Walker lançou o livro “De amor e desespero” (In love and trouble). Nele há 13 contos que revelam mulheres negras que buscam dignidade e amor.
O livro é perturbador justamente por revelar o poder das construções subjetivas e afetivas nas trajetórias daquelas mulheres negras distintas, porém unidas pela vulnerabilidade que se encontram. Vale a leitura.
* bell hooks tem seu nome grafado em letras minúsculas, sobre isso diz: “o mais importante em meus livros é a substância e não quem sou eu”.