Criando confiança nos nossos corpos

Uma das coisas mais difíceis em nossas vidas talvez seja criar um vínculo positivo em relação aos nossos corpos.

Não somos representadas na mídia, na moda, em nenhum lugar que seja considerado positivo, não somos nada representadas e quando nos deparamos com mulheres negras em fotos e afins, todas são magras, com um aspecto irreal comparado ao que nossos corpos se assemelham.

“Tenho um corpo normal” – esta frase dá a compreensão de que o corpo é magro? Ou gordo? Ou saudável? Um corpo magro não é saudável? Um corpo gordo não é saudável? Nunca saberemos com certeza, mas é claro que é bem mais provável visualizar um corpo magro do que um corpo gordo quando esta frase é colocada.

Então faz-se muito mais difícil de criarmos confiança em nossos corpos se a sociedade entende como padrão o corpo alto, magro e branco. Mas nem eu e nem você somos assim. Se somos magras, somos magrelas. Se somos altas, somos girafas. Se somos baixas, somos chaveiros. Se somos gordas, temos uma infinidade de prejorativos para nos apelidar.

Criar confiança em nossos corpos é muito difícil, apenas levando poucas coisas em consideração. Incluindo questões individuais de cada uma, essa tarefa se torna praticamente impossível.

Precisamos nos sentir bem para que consigamos confiar um pouco mais em nossos corpos. Precisamos descartar o enxame de imagens com o padrão de beleza eurocentrista para confiar em nossos corpos. Precisamos nos relacionar com ambientes saudáveis para nós conseguirmos, aos poucos, confiar em nossos corpos. Precisamos dominar e ocupar locais físicos e tecnológicos com nossas fotos e produções para confiarmos em nosso corpos, e isso tudo não é nada fácil, pelo contrário, é cada vez mais impossível.

Quantas vezes não nos culpamos por termos nossos corpos? Quantas dietas loucas já fizemos e quanto dinheiro já gastamos com as mesmas e com outros procedimentos completamente agressivos? Quantas de nós ja não nos submetemos à cirurgias e outras mutilações? Quantas vezes “perdemos” a vontade de usar roupa de banho na praia mesmo depois de termos passado muito tempo salvando salário para as férias com as crianças? Quantas de nós não entramos em dietas absurdas que apenas nos agridem para perder 5kg?

A falta de representavidade nos leva a fazer inúmeras coisas contra nossos corpos, buscando sermos um pouco mais parecidas com o que vemos diariamente na televisão, nas propagandas, nos filmes, revistas e outros locais na mídia. Torna-se cada vez mais difícil nos sentirmos bem com nós mesmas, seja em relação ao nosso cabelo ou nosso corpo no geral. Os ambientes seguros, onde podemos nos sentir bem e confortáveis, são muito poucos se compararmos às mulheres que ainda precisam estar em contato com eles e, muitas vezes, mesmo frequentando grupos seguros, ainda é muito complicado criarmos uma relação confortável com nossos corpos.

Precisamos continuar ocupando espaços que nos são de direito e praticar mentalmente a quase impossível tarefa de nos sentirmos bem com nossos corpos do modo que são e, assim, conseguirmos nos sentir à vontade para nos apresentarmos dentro e fora de ambientes seguros.

Outra forma de encontrarmos força nessa luta de aceitação, é consumirmos conteúdos que nos representem e também produzirmos este tipo de conteúdo. Um desfile de moda apenas com mulheres reais, um ensaio fotográfico e cada vez mais sermos vistas do modo que somos realmente. Devemos ser vistas, percebidas e ainda mais importante, devemos ser respeitadas.

Temos que permanecer unidas e precisamos dar continuidade ao respeito que temos uma pela outra, ao modo que cada um de nós consigamos nos sentir um pouquinho mais empoderadas e irmos quebrando aos poucos essa dificuldade extrema que temos em nos aceitar como nós somos e nos sentirmos um pouco mais confortáveis em relação aos nossos corpos.

 

imagem destacada: reprodução web

2 comments
  1. Não sofro de preconceito racial por fazer parte da maioria branca, apesar de minha descendência negra se fazer presente através dos cachos que estou lutando para retomar e as curvas de meu corpo. É realmente muito difícil conseguir conviver pacificamente com o seu corpo quando existe um bombardeio de como se deve ser para se encaixar em um padrão quase que irreal, então imagino como deve ser para vocês, negras, que são ainda menos representadas de forma positiva nas grandes mídias. Já vi dizerem que por não fazer parte de certa parte discriminada, a pessoa não ‘tem permissão’ para fazer parte da luta de uma melhoria na história delas. Eu não acredito nisso. Apesar do meu tom de pele ser claro, eu sou mulher, sou humana e NÃO ACEITO ver alguém ser diminuído pelo que quer que seja. Admiro muito a força que vocês têm para enfrentar essa luta diária e me orgulho de dizer que, ainda que não seja negra, procuro fazer minha parte para mudar e proteger o mundo de pessoas escrotas e que se acham no direito de ditar o que pode e o que é realmente bonito. Um grande beijo com muito carinho e admiração do coração mesmo.

  2. Que ótima reflexão! é sempre bom encontrar textos que relatam essa violência chamada “padrão de beleza”. Não sou negra nem branca, mas sou mulher e me identifiquei muito com cada frase lida e gostei muito dos conselhos dados. Temos que conseguir mostrar que não precisamos nos encaixar em padrões para sermos felizes, saudáveis e bonitas.

    Beijos

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