Geralmente quem leu meu relato sobre o que aconteceu comigo na Puc Campinas faz essa pergunta constantemente. Afinal o que aconteceu? Várias situações surgiram, ato de apoio, muita gente que eu admirava não “entendendo”, bem entre aspas porque afinal tomar o meu relato como uma agressão, vitimismo e supor um racismo inverso, vai muito além de não entender, é oprimir; professores me surpreendendo negativamente, outras positivamente. Entre os alunos eu diria que 90% se colocaram em situação de defesa e ataque.
Mas que sinto é uma leveza e talvez uma dorzinha, mas nada se compara com antes, fico feliz que algumas pessoas tenham se afastado, acho melhor do que a falsidade e a preocupação com o NOME da universidade. Eu queria muito alguns dias chorar e gritar, dane-se os nomes, eu sou uma pessoa! Ao mesmo tempo em que queria agradecer sempre quem ficou do meu lado naquele momento, o que me foi tão importante que nem sei como exprimir a gratidão que sinto. Eu tive meu espaço agredindo, fui ameaçada, perseguida, por pessoas que nunca pararam dez minutos para conversar comigo, porque afinal eu era incomodo só pelo que eu postava no facebook. Eu ainda sou e talvez mais, mas me sinto leve por ter dito o que antes doía só em mim.
Hoje eu vivo no meu mundo, com os meus colegas que conto nos dedos da mão. Existe um mundo que se quer perfeito baseado em privilegiado, uma verdadeira bolha branca e racista, que foi um incômodo TÃO GRANDE apontar suas fissuras que reafirmo Universidades são Opressoras e alguns universitários assustam com seus pensamentos e comportamentos conservador, racista e elitista Pode ter a roupa descolada e dread no cabelo, mas sem consciência nenhuma sobre racismoe machismo, que pode supor racismo com brancos e preconceito com elites e não entender que outra realidade existe e pra ela ser quebrada não adianta falar que o negro é vitimista ou dizer que cotas são injustas, racistas e preconceituosas.
Afinal o meu papel como mulher negra é falar sobre a minha consciência de ser mulher e negra, eu sou cotista, eu estou cursando arquitetura que é um curso elitizado, eu sou mulher, e sei que cada negro representa mais inúmeros quando falamos o que acontece com outros 1000, quando falamos de nossas particularidades e nada quebra essa aliança de dor que existe. Talvez lá na PUC ninguém entendeu, mas muitos de fora me ajudaram mesmo que de longe só com palavras e isso me emociona. Nossos relatos são parecidos infelizmente, não é atoa que recebi inúmeros que contavam histórias parecidas com a minha, é por isso que escrevi esse texto, para expor uma delas, à do Antônio Santos:
“Sou aluno do 6º período de Direito da Puc MINAS, bolsista integral do prouni, negro, possuidor de excelentes notas desde que entrei no curso e até a presente data era representante de turma. Porém, desde que iniciou-se as aulas de um determinado professor, venho sofrendo inúmeras humilhações por parte do mesmo. No primeiro dia de aula, o referido professor ao saber que eu era o representante de turma me hostilizou, sem ao menos me conhecer. No mesmo dia ele me humilhou por não ter um relógio e uma agenda para que eu informasse as horas e datas para ele quando ele ordenasse.
Em seguida, me disse que era minha obrigação apagar o quadro e fazer chamada para ele em todas as aulas. Eu prontamente fiz, porque acredito que faça parte das funções do representante de turma. Na aula que se sucedeu o professor faltou e não comunicou a turma. Como há vários alunos irregulares na sala, que se deslocam de bairros distantes somente para assistir a aula desse professor eu enviei um e-mail para ele perguntando se haveria a aula posterior a que ele faltou, mas o mesmo além de ser grosseiro comigo por e-mail, retomou o assunto na sala e me humilhou novamente, quando eu fui argumentar, ele gritou mais ainda e disse que minha palavra estava CASSADA, e que eu só poderia falar na hora que ele mandasse.
Diante do que foi exposto, me questiono como uma instituição de renome como a puc pode manter um professor no curso de Direito, no Estado Democrático de Direito, que cerceia direitos fundamentais do aluno, como o direito a fala, e a comunicação por exemplo. Fui silenciado, em razão da minha cor de pele? Um negro não poderia em hipótese alguma estar em uma posição de liderança na turma que isso seria uma afronta? Lembrando que ele trata os alunos brancos razoavelmente bem, ainda que eles sejam descompromissados.Elogia a Alemanha, e enaltece a beleza eurocêntrica predominante na sala.
Na aula seguinte o professor novamente entrou na sala me insultando em razão do quadro estar escrito, porém, o mesmo havia esquecido que na aula anterior ele não tinha terminado a matéria porque gastou o tempo da aula com assuntos avulsos, e pediu para que transcrevêssemos os tópicos da aula no quadro antes que o mesmo chegasse para a próxima aula. Ou seja, mais uma vez fui rechaçado pelo professor, sem motivo.
Por fim, na aula de hoje , enquanto fazia chamada,marquei falta indevidamente a uma aluna, mas sabe-se que isso é comum até entre os professores, e como ela percebeu na hora, prontamente eu me dispus a corrigir o erro. Contudo, o professor novamente me humilhou e antes que eu fizesse a retificação ele me cassou o direito a fala e disse que ele era a autoridade na sala, portanto só ele poderia fazer a retificação.
Sucumbido pela opressão psíquica que ele me afligiu incansavelmente, renunciei ao cargo de representante de turma, porque esse professor não tinha respeito algum por mim. O professor me privou de sentar no local onde costumo me sentar, ou seja, na primeira carteira. Disse com todas as letras que não gosta “do meu jeito”, e perguntou meu nome para poder guardar na hora de corrigir minha prova e finalmente zerar as minhas questões a fim de que eu seja reprovado e perca minha bolsa.
Espero que o meu clamor seja ouvido, para que outros alunos não tenha que se submeter as mesmas arbitrariedades e opressões devido a sua cor de pele e condição social.”
Novamente um aluno do PROUNI, queria ressaltar que esse programa não é o problema, aliás ele facilita que alunos como eu tenham chances de estudar em universidades como a PUC, entretanto sua elaboração não considerou o choque de realidade que seria inserir alunos de renda baixa, consequentemente em sua maioria negros, em contextos elitizados como grandes Universidades. Estive na USP recentemente e os relatos eram bem parecidos, ou seja, não e um problema de particular ou pública, e sim de universidades elitizadas que não promovem a integração plena de alunos pobres e negros em seu meio, porque não sentem a necessidade de alterar o sistema no campo real, mas só nas palavras, aulas e teses.
A PUC Campinas abriu uma sindicância, segundo eles para apurar o que eu disse, aparentemente ela não teve um resultado já que não me foi indicado nenhuma solução. A PUC Minas, onde o Antônio estuda tomou algumas providências após ele relatar o ocorrido, ele pediu pra mudar de turma e não ter mais aula com o professor racista e isso foi feito, o que a meu ver devia ter sido resolvido de outra forma o professor ser demitido ou no mínimo não dar aula mais pra turma dele, ele também abriu um processo no colegiado e na ouvidoria.
As Universidades estão sempre dizendo que não devemos estar lá, das formas como podem dizer. Então sejamos os representantes de mudanças.
“Mas você tem que chamar atenção pelos seus méritos!” Me diziam.
Chamaremos pelas nossas falas, lutas na sala, na rua, na internet, na mesa do bar, em palestras. O incomodo não é só na nossa presença, esses estamos impondo porque é nosso direito. Mas também com nossa VOZ. Então falaremos sempre.
Imagem – time.com